Chomsky

                                        por Moisés Neto


Palestra proferida no auditório da FAFIRE (Recife) dia 4 de setembro de 2002.

PARTE 1

Os escritos políticos e as análises da ideologia imperialista americana feitos pelo professor Noam Chomsky, parecem ser mais conhecidos na França e nos EUA do que a disciplina que ele criou: a gramática gerativa. Não há conexão, segundo ele, entre a política e seus estudos lingüístico, ou se há, é num nível “bastante abstrato”. “Para análise da ideologia só precisamos de abertura de espírito, de inteligência, e de um certo um cinismo sadio, tal análise não é muito científica. A intelligentsia (os “senhores do saber”) querem dar a impressão de que só intelectuais providos de formação especial seriam capazes de fazer um trabalho analítico, inacessível às pessoas normais. Isto é controle ideológico, cuja finalidade é afastar a população destes temas, persuadindo-a de sua incapacidade para organizar os próprios negócios ou para compreender a realidade social sem o intermédio de um tutor. Os temas científicos, estes sim exigem formação cultural e técnica, ou referências intelectuais, antes de ser tratados”.

Quando ocorre um grande acontecimento, como os eventos de 11 de setembro de 2001, nos EUA, a mídia corre atrás dos cientistas políticos para “explicar” os fatos. Mas a opinião das pessoas de outras áreas também é válida.

Chomsky diz que já deu conferências em Harvard e em outras universidades para professores/doutores de matemática, e ele não tem doutoramento em matemática. Ninguém questionou isto. Eles queriam saber se as idéias dele eram certas ou erradas e se o assunto era interessante (no caso tratava-se da “lingüística matemática”). E não dos seus certificados.

Mas os cientistas políticos consideram Chomsky um outsider, do ponto de vista profissional, e não o habilitam a falar sobre o assunto. Só que ele consegue informações que não estão na mídia e não são divulgadas pelos tais sujeitos também.
Sobre a mídia, Chomsky diz: “certos jornais, TV e revistas praticam uma política de colocar lado a lado informações contraditórias, é um jogo da propaganda. Sabemos que nos EUA até o início dos anos 80 não havia nenhum comentarista político sindicalizado. Eles simplesmente hoje em dia refletem a ideologia das instituições econômicas no poder. Foi assim que a mídia americana agiu na questão do Vietnã: propaganda governamental sem questionamentos. A elite, intelectual só reclamou do preço. O que vemos é submissão absoluta num grau notável de conformismo. A ideologia americana é bem menos diversificada do que a da Espanha fascista na época de Franco, ou em Portugal de Salazar. Ali, intelectuais apoiaram a libertação das colônias africanas.”

E continua: “Há sinais de que os EUA afundaram um submarino japonês antes do ataque a Pearl Habour. E de campos de concentração na América do Norte durante a 2ª Guerra Mundial”.

Chomsky constata que “A Guerra Fria resultava de ação recíproca, devida a motivos econômicos das duas potências imperialistas (Rússia e América)”.

A ameaça de recessão econômica e estagnação inibe uma consciência política no mundo capitalista hoje. Nos anos 60 essa ameaça era menor e as pessoas reagiam.
É uma enorme máquina ideológica: “Watergate não foi um triunfo da democracia. Nixon caiu porque atacou os poderosos. Gente da IBM, do Washington Post, do partido democrata. Se tivesse atacado apenas os negros e os movimentos sociais, como ele fez cruelmente através de assassinatos políticos como o do líder dos Panteras Negras, Fred Hampton, Nixon teria escapado. Esse assassinato de Estado, em conluio com a polícia e o FBI, é uma mancha na história americana e ninguém imputou a Nixon essa culpa, nem ao FBI, que mandava metralhar a casa de pessoas que ousassem promover debates econômicos sérios. O FBI mandava jogar bombas em teatros, ou contratava pessoas para instigarem grupos de esquerda a cometeram atos radicais, para justificar a repressão da extrema direita contra eles."

Sob a direção de Bob Kennedy (1961) o FBI lançou programa contra o partido dos trabalhadores, nacionalistas negros e movimentos pela paz em geral. Coisas como essas, não são novidades nos Estados Unidos, mas desde o Presidente Truman (1947) isso vem se acentuando. A CIA exterminou 40 mil pessoas em dois anos, em Saigon. Chomsky dedica sua vida a procurar e divulgar notícias como estas, que os jornalistas desconhecem, ou sobre as quais se calaram, assim como os historiadores e os cientistas políticos.

Kennedy, Johnson, Nixon, Ford, Carter, Reagan, Bush, Clinton perpetraram crimes numa escala que muitos ditadores nem sonharam. “Os EUA querem que estas histórias sejam esquecidas (isto também interessa aos países do G7). Querem ser dignos de confiança. Refazer a história. A intelligentsia está encarregada disso. Porque é preciso justificar logo outras intervenções americanas como a do Iraque, por exemplo. Os EUA não têm direito legal nem moral de intervir em determinados países com o intuito de criar uma ordem econômica global conforme as necessidades de sua economia”.

Os atentados de 11 de setembro de 2001 mudaram profundamente o cenário geopolítico. Constituem algo inteiramente novo na política mundial. Para os EUA foi a primeira vez, desde 1812, que o território nacional foi atacado (em 1812 um batalhão inglês conseguiu chegar até Washington, incendiar edifícios públicos obrigando o presidente James Madison a fugir da capital). Pearl Harbour (atacada em 7/12/41) era colônia.

Durante os últimos séculos os EUA exterminaram populações indígenas (milhões de pessoas), conquistaram metade do México, mataram centenas de milhares de filipinos. A Europa está acostumada a atacar países e não ser atacada. Inglaterra não foi atacada pela Índia, nem Itália pela Etiópia, com quem travou guerra nem a França pela Argélia, por isso a Europa ficou chocada com 11/09/01. Mas chamar de “guerra ao terrorismo” o que se sucedeu é uma farsa a mais no meio da propaganda, quando na verdade os EUA são um Estado líder do terrorismo (assim como os países que se constituem seus principais aliados).

Os atentados foram usados/explorados para acelerar o cronograma de militarização e reversão dos programas sociais democráticos, além de favorecer a transferência de riqueza para segmentos restritos e tiveram um efeito devastador sobre a causa palestina, aumentando a pressão de Israel.

Os EUA na verdade são das culturas mais extremamente fundamentalistas, que nos anos 80 atacou a igreja católica na América Latina (com sua opção pelos pobres). Em 86 os EUA foram condenados pela Corte mundial por “uso ilegal da força” (terrorismo internacional) e então vetou uma resolução do conselho de segurança da ONU que instava todos os países (referindo-se aos EUA) a aderir leis internacionais. Riram do “ultraje” que seria a Nicarágua processá-los.

Quando explodiram um prédio em Oklahoma (anos 90) acusaram os árabes, e os culpados eram americanos dos estados de Montana e Idaho, ninguém pensou em bombardeá-los.

Nos anos 1980, na Nicarágua, dezenas de milhares de pessoas morreram atacadas pelos EUA e os ataques foram acompanhados por uma arrasadora guerra econômica, mas quando a Corte Mundial ordenou que EUA pagassem indenização/reparação, os EUA desdenharam e intensificaram ataques à Nicarágua. Não houve discussão a respeito da opção de seguir o “caminho da lei”.

Muitos, mesmo em Nova York pós 11/09/01, eram contra retaliação cega. EUA usavam Bin Laden para personificar o “grande mal”, como alemães usaram os judeus. Laden foi treinado pelos EUA (contra os russos).

Qualquer um que tenha conhecimento/consideração das leis internacionais, sabe que os EUA são um estado “líder do terrorismo”. Reagan em 1985 promoveu atentados em Beirute com canhões-bombas na frente de uma mesquita 90 pessoas morreram, centenas ficaram feridas. Milhões de civis morreram no Iraque, meio milhão de crianças em 91. Clinton destruiu as indústrias farmacêuticas do Sudão em 98, um bombardeio que sacudiu o país. Milhões de pessoas foram vítimas dos atentados, crianças inclusive. Os que sobreviveram ficaram sem remédios e Tony Blair do PT inglês recusou-se a ajudar os feridos. Um ato terrorista tanto quanto o do WTC/Pentágono.

E agora EUA declaram guerra a quem não se aliar a Washington, isto é, a maior parte do mundo.

Por isso terroristas encontram adeptos para a sua causa deplorável. Quando uma nação é atacada deve-se retribuir na mesma moeda? Se fosse assim, Nicarágua, Vietnã do Sul, Cuba, Sudão, Iraque e, tantos outros deveriam soltar bombas nos EUA.
Um exército apoiado pelos EUA assumiu o controle na Indonésia (1965) matou centenas de milhares de pessoas (maioria camponeses), um massacre que a CIA comparou a Hitler, Stalin e Mao.

Na era Regan EUA apoiou massacre de 10 milhões e meio de pessoas, prejuízo de 60 bilhões de dólares na África do Sul.

Estas vítimas pouco sabem dos seus direitos diante do assalto terrorista internacional. Os EUA fornecem helicópteros para ataques assassinos de Israel contra palestinos. Bush avisa: “Juntem-se a nós ou enfrentem a destruição” e o Afeganistão imitando-os, conclama muçulmanos (em dimensão menor, claro).

Nos anos 80, EUA e Inglaterra prestavam apoio a Saddan Hussein .

Laden pretendendo derrubar governos não-islâmicos do Egito, em 97 assassinou 60 turistas (para destruir indústria de turismo)

Por outro lado a invasão do Líbano por Israel matou 18 mil pessoas (civis liberais e palestinos) e em 93 e 96 contavam com apoio dos EUA – até Clinton recuar (em 1996).
Nos anos 90, na Turquia, EUA forneceram 80% das armas para esmagar insurreição dos curdos, matando dezenas de milhares de pessoas, e deixando 3 milhões de desabrigados, 3.500 vilas destruídas.

No Timor Leste, EUA bancou os agressores indonésios até 1999 (Clinton ele comunicou aos generais que “A Brincadeira” havia terminado; sofreu pressão para parar).

A França também tem patrocinado o terror promovendo com o EUA “o uso calculado da violência para atingir objetivos políticos, religiosos ou ideológicos”. A propaganda usa a palavra “terrorismo” para designar quem é contra EUA & Companhia.

A Aliança do Norte (92/95) é apavorante: massacres, estupros em massa, “limpeza étnica”, foram “expulsos pelo Talibã”, que destruiu até estátuas budistas milenares (outra desgraça). O ideal seria um tribunal internacional sob as ordens de uma ONU mais equilibrada, mas o que vemos é a privatização deste órgão internacional.
Para conquistar Oriente Médio, o FMI oferece pacotes em troca de apoio. O Afeganistão deve ser sítio de oleodutos para EUA controlar as reservas da Ásia Central.

TV Al-Jazeera sofreu repressão de Washington que exigiu da mídia americana/mundial um "silêncio obediente”.

Hoje devemos estar atentos a tantos fatos que não chegam facilmente ao nosso conhecimento. Daí a importância de pensadores como o norte-americano Noan Chomsky.

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Moisés Neto

Professor com pós-graduação em Literatura, escritor, membro da diretoria do SATED (Sindicato dos artistas e técnicos em espetáculos de diversão em Pernambuco).


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