MAURO MOTA

O poeta pernambucano Mauro Mota nasceu em 1911. A cana -de- açúcar, as festas , as procissões, os feriados cívicos, "a gente do povo", os senhores de engenho, tudo isso marcou este advogado, jornalista e prestigiado escritor, famoso por seu livro "Elegias", onde poemas com grande potencial verbal e extraordinária imagística chegaram a ser traduzidos em várias línguas. Praticou também a poesia social, mostrando simpatia pelos humildes. Seu "protesto" vem carregado de emoção no poema "A tecelã" , no qual uma adolescente que, partindo para o trabalho, deixa "chorando na esteira" o seu filho " de mãe solteira", levando consigo a marmita "contendo a mesma ração/ do meio de todo dia/ a carne-seca e o feijão".

Produziu estudos sobre folclore, crônicas, estudos de sociologia regional e geografia, tudo num discurso claro, elegante.

Nas "Elegias" , ele se descobre pela dor. Usou a forma clássica, a musicalidade. O tema central deste livro é a morte(e o passado): "As mãos frias que amei(...)se parecem dormir não as despertes(...)As mãos frias que amei, que desespero vê-las cruzadas, frias, lânguidas, inertes."(Elegia Nº 8).

Reviveu o passado com sua poesia, redimensionando tempo e espaço. É o poeta dos subúrbios: "Recife rica de subúrbios franciscanamente simples e naturais" , "brasileiras casas de porta- e- janela ou pequenos chalés", "Ó Rua Real da Torre,/ que mistérios ocultais (...) nas casas de telha vã/ nos crepúsculos pousados/ nas copas dos flamboyants? (...) os vizinhos nas calçadas/cadeiras de lona se abrem para as almas conversarem" (em "Rua Real da Torre"). Também foi "regionalista" : "Vinha dos banguês a doçura dos ares/ pregões de cocada, alfenim, caramelo./ Doçura do mel de engenho com farinha" (em "Doçura nazarena" ). Analisou o fenômeno da Segunda guerra mundial e seus efeitos no Recife em "Boletim sentimental da Segunda Guerra". São comuns também a referência à sua amada que praticamente viu morrer em seus braços: "Tua lembrança chega esta noite/ depois de percorrer longos caminhos do espaço /rompido pelas músicas da distância/ sinto alma toda aberta, pura branca, horizontal/ tua lembrança passando/ suave e leve/ como o azul cai do céu na superfície estática das águas/ como uma sombra de criança em jardim de orfanato/como uma réstia de luar desce da clarabóia e pousa no rosto pálido de uma moça doente" ( em "Lembrança"). Observe a influência simbolista. A "casa" (ESPAÇO) é o centro das recordações("A casa agora mora no antigo habitante "), resiste a qualquer mudança, é poeticamente reconstruída, é o "abrigo", a "proteção", "ninho de lembranças", "integração de pensamentos e sonhos", continuação do colo materno, algo vivo no poeta: "Lá estou como eu era(...) quem me chama ou me leva/quando o espaço transponho? Só o verde das heras / sobre as vozes e os sonhos"(em "A Casa"). A casa é morada dos fantasmas do passado, abriga o que o tempo destruiu, preserva fielmente o vivido. Falando das ruas antigas do bairro da Torre, expõe suas lembranças: "Tropeço nos passos perdidos(...) Ó velhos chalés de 1830/eterniza-se entre as paredes o eco de invisíveis habitantes/mãos de sombras femininas(...)cheiro dos cabelos dos fantasmas das moças de outrora. " (em "Rua Morta") .O poeta encontra-se consigo mesmo numa" casa personificada" , a casa dos avós no bairro da Madalena: "o rio atrás(...) na frente o jasmineiro e, no oitão , carregado,/ o pé de fruta-pão" .

O rio Capibaribe (limpo naquela época, até para banhos), os sobrados do Recife, os objetos, são um convite à imaginação do poeta, para ele as coisas "sentem" (tristeza, solidão, alegria, compaixão, raiva, inquietude:" A fonte canta", "o vento grita", "o cacto chora", "o candelabro faz acrobacias". A morte é questionável: " quem morre no Recife engana a morte/ se criei no azul, os meus azuis foi para/ esta cidade que me ressuscita" (em " Diálogo com Carlos Pena Filho").

O tempo é o elemento-chave na obra de Mauro Mota. O tempo que foge. O homem que é eterno viajante (até de si próprio): "Vou em busca do Ter-ido/ desapareço no espaço/procuro-me e não me acho" (em "Itinerário")

O vanguardista Mauro Mota foi o poeta do cotidiano.

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Moisés Neto

Professor com pós-graduação em Literatura, escritor, membro da diretoria do SATED (Sindicato dos artistas e técnicos em espetáculos de diversão em Pernambuco).


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